Pegar o elevador com os melhores já era missão cumprida. Com jogos de
igual para igual, vitórias emblemáticas e feitos impensáveis até pouco
tempo atrás, as coisas caminhavam bem, obrigado, para o basquete
brasileiro. O problema é que, na entrada da sala VIP, onde só os
gigantes circulam, sempre tem um segurança chato e catimbeiro, que
insiste em sorrir com o canto da boca, coçar as costeletas e decretar em
sotaque portenho: "¡No pasarán!". Nesta quarta-feira, o Brasil foi
barrado ali outra vez. Com uma derrota doída por 82 a 77 para a carrasca
Argentina, a seleção de Rubén Magnano se despede das Olimpíadas de
Londres. E continua procurando uma maneira de se esgueirar pela porta
que leva à elite da bola laranja.
Pela primeira vez jogando na Arena North Greenwich, que passa a receber o
torneio na fase decisiva, o basquete masculino do Brasil perseguia sua
primeira semifinal olímpica desde 1968, quando ficou em quarto lugar.
Não deu. Ok, o jejum de 16 anos sem participações nos Jogos foi
quebrado, a evolução na quadra foi evidente, mas o tal segurança
marrento estava lá de novo, e por trás dele vinham Scola, Ginóbili,
Nocioni, Delfino, Prigioni, gente acostumada a castigar quem veste verde
e amarelo.
- Tínhamos a expectativa de ganhar, e isso não é uma justificativa, mas
estou muito orgulhoso de ter defendido o Brasil nos Jogos Olímpicos. É
uma honra trabalhar com esse grupo de jogadores. Infelizmente, nosso
sonho acabou, mas temos um novo apetite para o futuro. Todos viveram uma
grande experiência aqui, inclusive eu, que já disputei as Olimpíadas
antes. Temos que sair do vestiário com a cabeça boa - afirmou o técnico
Magnano, que, ao lado de Guilherme Giovannoni na entrevista coletiva,
mostrou-se surpreso quando soube que os jogadores não voltaram do
vestiário para a zona de entrevistas, como de hábito - falaram apenas
com as TVs. O drible lembra o que aconteceu após a eliminação no Mundial
de 2010, contra a mesma Argentina, quando só Tiago Splitter passou para
dar declarações.
Como não há disputa de quinto a oitavo em Londres, resta aos brasileiros
tomar o avião de volta. Assim como fez após cruzar com os hermanos no
Pré-Olímpico de Las Vegas em 2007, no Mundial da Turquia em 2010 e na
final do Pré de Mar del Plata no ano passado. A Argentina avança para
enfrentar os Estados Unidos, a não ser que a zebra australiana apronte
no confronto das 18h15m (de Brasília). Na outra semi, Espanha e Rússia
medem forças.
Ponto forte do Brasil, o garrafão falhou na hora da verdade. Tiago
Splitter fez apenas seis pontos, Varejão fez quatro, e Nenê adicionou
sete. Com aproveitamento muito abaixo do esperado nos lances livres,
acertando apenas 12 dos 24 tentados (50%), o Brasil também chutou mal de
três (7/23). Magnano lamentou, mas disse que não há o que fazer durante
o período de treinos do grupo.
- O aproveitamento de lances livres só tem uma solução: treinar lances
livres. E não se treina lances livres em 45 dias de concentração, se
treina em 365 dias nos clubes - disse o técnico.
Na gigantesca North Greenwich, ocupar os 20 mil lugares é tarefa árdua
para qualquer multidão de basqueteiros. Sobravam lugares azuis vazios
nas arquibancadas, mas a parte de cima, mais barata, estava cheia. Foi
lá que os argentinos se empoleiraram para cantar o tempo todo, como de
hábito. Lá de longe, viram Splitter ganhar o primeiro duelo com Scola,
no tapinha inicial. No fim, o argentino triunfaria, mais uma vez como
cestinha da equipe, com 17 pontos, seguido pelos 16 de Delfino e
Ginóbili. Huertas e Leandrinho comandaram o Brasil com 22 cada.
Foi Huertas que tratou de fazer a primeira cesta com pressa, numa prévia
do que estava por vir no período inicial. Scola logo deu o troco com um
arremesso por cima de Tiago. Terminou o período com seis pontos, sem
errar um chute sequer, mas com duas faltas. Leandrinho também fez suas
duas e pouco depois foi para o banco. Mas não fez falta como cestinha,
porque Huertas colocou o ataque nas costas. Com 13 pontos, o armador
manteve o Brasil à frente quase o tempo todo. Quando Delfino acertou
duas seguidas de três, ele respondeu na mesma moeda. E o quarto só não
terminou de forma espetacular porque o arremesso de Larry Taylor do meio
da rua, no estouro do relógio, carimbou o aro. Para o Brasil, estava
bonito: 26 a 23.
Com a mão certeira de Delfino, que pulou para 11 pontos, a Argentina
abriu cinco no início do segundo período. E a torcida cantava, cantava,
cantava, ignorando a trilha sonora pop a cada bola parada. Nenê enfim se
soltou com uma cravada a dois minutos do fim, mas na defesa não
conseguia impedir os arremessos de Scola e Juan Gutiérrez. Huertas ainda
brilhava no ataque, com 17 pontos antes do intervalo, mas o resto do
time não conseguia acompanhá-lo. Leandrinho, figura quase nula, errou
dois lances livres a dez segundos do fim do primeiro tempo. E a atuação
verde-amarela despencou de nível. Com 14 de Delfino e dez de Scola, os
hermanos foram para o descanso vencendo por 46 a 40.
O placar até que não tinha fugido do controle, mas ficou a impressão de
que o Brasil esqueceu de voltar para o terceiro quarto. Ligada, a
Argentina jogou a vantagem para oito com uma cesta de Nocioni e para dez
com uma bandeja de Ginóbili. Chegou a 12, enquanto do outro lado Alex
errava bandeja, Leandrinho entortava os arremessos. Magnano ainda tentou
mudar lançando Marcelinho Machado, mas não adiantou. O que era uma
diferença ameaçou se transformar em abismo quando chegou a 15. Para
evitar o pior, a seleção ainda cortou para oito, mas nada além disso. A
última bola, de Leo Gutiérrez, ainda ficou encravada entre o aro e a
tabela. Igualzinho ao basquete que o Brasil jogava naquele momento. Na
virada para o último período, Argentina 64 a 54.
Veio então uma sequência emblemática. Com a chance de cortar para cinco
pontos, Machado soltou um arremesso de três em que a bola se estatelou
na tabela, sem sequer rapar no aro. Do outro lado da quadra, Scola
soltou uma bola suave de chuá e abriu dez de novo.
Ainda assim, a diferença foi caindo. Para quatro com uma cesta de Nenê,
na marra. Podia ter ido a dois se Leandrinho não tivesse errado uma
bandeja absolutamente livre, mas Alex consertou a lambança em seguida:
70 a 68, faltando quatro minutos. O problema é que, na sequência, o
próprio Alex fez uma falta de ataque e chutou torta uma bola de três.
Magnano chamou o time para conversar com 2m27s no relógio, meia dúzia de
pontos atrás.
Leandrinho calibrou a mão e acertou de três. O jogo ficou tenso, com os
dois ataques pensando duas, três, quatro vezes antes de definir. Tanto
que já no minuto final, Huertas teve de forçar um tiro de três, que mal
bateu no aro. Manu, com a calma dos seus 35 anos, guardou dois lances
livres para abrir cinco. Scola fez o mesmo para abrir sete, depois nove.
Estava selado o destino brasileiro em Londres. E o cenário não era
muito diferente do que vinha acontecendo nos últimos anos: campanha
digna que esbarra no incômodo sotaque castelhano
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