O desafio era gigantesco: vencer o atual campeão mundial e número 1 da
categoria meio-pesado (até 81kg), o cubano Julio La Cruz Peraza, que já
havia o derrotado três vezes, inclusive na final dos Jogos
Pan-Americanos de 2011. Yamaguchi Falcão não se intimidou: com uma
tática perfeita, venceu o adversário pelas quartas de final das
Olimpíadas, garantiu mais uma medalha olímpica para o boxe do Brasil - a
terceira em Londres 2012 - e se tornou forte candidato ao ouro, numa
divisão que não é a sua - o capixaba lutava anteriormente como
peso-médio (até 75kg), mesma categoria em que seu irmão Esquiva
conquistou outra das três medalhas do país na modalidade.
- Estou com vontade até de sentar no chão e chorar! É f.... É uma
emoção nem por ter conseguido a medalha, mas por vencer o cubano, que é o
melhor do mundo. É uma honra não só para mim, mas para a família Touro
Moreno completa - extravasou Yamaguchi logo após a vitória, em
entrevista ao SporTV, lembrando de seu pai, o ex-pugilista Adegar Falcão, que tinha o apelido de "Touro Moreno".
- Olha, paizão, eu me preparei. Você é um cara que me dá força máxima,
me dá conselho, e quero agradecer a toda a minha família - minha mãe,
meu pai, minha esposa, porque a gente fez muito para estar aqui. Fiz o
"L" para o Luciano, meu irmão caçula, que falou para eu dar uma "zoada"
quando vencesse o cubano! Estou louco pra ver meu irmão (Esquiva),
abraça-lo e dizer: "A família Falcão é f..." - se empolgou.
Com o triunfo, os irmãos Falcão se juntaram à galeria de irmãos
brasileiros medalhistas em Olimpíadas, como Murilo e Gustavo, do vôlei,
Tande e Adriana Samuel, do vôlei e vôlei de praia, e Torben e Lars
Grael, da vela. Na sexta-feira, os filhos de Touro Moreno estarão de
volta ao ringue pelas semifinais, contra representantes de duas escolas
tradicionais do boxe. Esquiva enfrenta o britânico Anthony Ogogo, e
Yamaguchi encara o russo Egor Mekhontcev, que venceu o uzbeque Elshod
Rasulov nas quartas. Se vencerem, disputam o ouro, em busca de outro
feito raro: serem campeões olímpicos juntos. Apenas uma vez isso
aconteceu no boxe, com os americanos Leon e Michael Spinks, em Montreal
1976.
A LUTA
De azul, Yamaguchi tomou o centro do ringue no início, mas ficava com
as mãos erguidas, mais preocupado em se defender da grande envergadura
do cubano. La Cruz fazia o contrário: girava pelo ringue com agilidade,
de guarda baixa, e passava com cruzados perigosos. O campeão mundial
mostrava boa esquiva e golpes velozes, mas o capixaba estava bem e
acertou alguns bons socos. O round terminou empatado em 4 a 4.
La Cruz passou a andar mais para frente no segundo round. Yamaguchi,
todavia, ganhou confiança com o bom primeiro assalto e acertou um bom
direto e um gancho para fazer o cubano dar passos para trás. O
brasileiro cresceu no combate e o campeão chegou a cair - mas não por
conta de um golpe; se desequilibrou ao tentar se esquivar de um cruzado.
Yamaguchi ainda acertou dois golpes duros no final para fazer 6 a 5 e
passar à frente no placar, 10 a 9.
- Eu me preparei para não correr atrás dele, para esperar ele vir.
Joguei a isca e ele foi fisgado - riu o pugilista brasileiro.
O cubano veio para cima no último round para virar o placar, mas
Yamaguchi não mudou a tática: seguiu com a guarda fechada, atacando
somente no contragolpe. O brasileiro teve boas sequências nos primeiros
minutos e ainda acertou dois ganchos na lateral da cabeça. La Cruz
continuou andando para frente e Yamaguchi passou a se segurar no
clinche. O lutador de azul levou alguns avisos por tentar clinches
demais e fez o máximo que pôde para fugir do adversário. Um direto do
cubano entrou e Yamaguchi sentiu, mas ele se defendeu e ainda terminou
golpeando.
Ao final, tanto o treinador do boxe masculino do Brasil, João Carlos
Barros, como o do time feminino, Cláudio Aires, comemoraram, antes mesmo
do anúncio oficial. Quando o juiz ergueu o braço de Yamaguchi, a
revanche estava completa: 8 a 6 no último round e 18 a 15 para o
capixaba, que soltou um berro.
- Tirei um peso muito grande das minhas costas, o peso que estava desde
o Pan de Guadalajara. Eu merecia muito essa vitória. Hoje, falei para
minha esposa: "Não vou lutar pela medalha, mas pra tirar aquela derrota
do Pan". Estou com uma vontade de dar um grito bem alto de emoção para
tirar isso que estava engasgado - desabafou Yamaguchi.
Quem vai ficar engasgado por quatro anos é La Cruz, e todo o povo de
Cuba, que apesar da ampla tradição no boxe, jamais conseguiu um ouro na
categoria meio-pesado. Para Yamaguchi? Restou apenas um corte abaixo do
olho esquerdo de lembrança.
- Para a alegria que estou, esse olho aqui amanhã já está ótimo - concluiu.
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